Foto: Konrad Ziemlevski (https://unsplash.com/photos/I8HGotYF8p0)
O sistema judicial brasileiro, em setembro de 2019, foi palco de cenas de humilhação de pessoa vítima de estupro. A paciente alegou ter tido um lapso de memória e acreditou ter sido dopada. Foi confirmado por exame pericial, ser virgem até então.
Todo ato sexual deve ter o consentimento das partes e o estupro é um crime caracterizado pelo abuso para obter conjunção carnal ou ato libidinoso.
Na audiência a vítima foi humilhada pelo advogado de defesa. Ele mostrou fotos publicadas nas redes sociais, as classificou como “ginecológicas”, afirmou “jamais teria uma filha” daquele “nível”. Após a vítima chorar, afirmou “não adianta vir com esse choro dissimulado, falso e essa lábia de crocodilo.” Também disse “É teu ganha pão a desgraça dos outros? Manipular essa história de virgem”.
A vítima reclamou com o juiz: “Excelentíssimo eu estou implorando por respeito, nem os acusados são tratados do jeito que estou sendo tratada, pelo amor de Deus, gente. O que é isso?” O juiz pediu para se manter o nível, parou a gravação para ela se recompor e tomar água.
Sem entrar no mérito da sentença proferida, pois isso exigiria a análise detida do processo, a partir das cenas deprimentes da audiência é necessário anulá-la.
Gilmar Mendes, ministro do Supremo Tribunal Federal, STF, comentou: “O sistema de justiça deve ser instrumento de acolhimento, jamais de tortura e humilhação.” No caso, o sistema foi palco de humilhação e desqualificação da vítima, em audiência coordenada por agentes públicos, com afronta à dignidade humana da vítima.
O caso relatado, é exemplo clássico de violência aos direitos humanos, onde, às vezes, a estuprada ao procurar as autoridades (delegacias, promotorias, justiça, etc.) e advogados são contestadas, são acusadas de se exibirem fisicamente (uso de roupas decotadas, publicação fotos nas redes sociais, etc.). Após isso, muitas delas se culpam e até se convencem poder ter evitado a agressão. Na verdade ocorre a inversão, onde a vítima se torna a acusada, onde todos esquecem de a estuprada não ter consentido com o ato sexual, além disso, a forma da pessoa se apresentar na sociedade não autoriza ninguém estuprá-la.
Também, o ocorrido demonstra ser a jovem provinda de família trabalhadora e simples. Caso ela fosse de família de empresário poderoso, político influente ou mesmo de um criminoso de alta periculosidade, todos os atores da audiência atuariam para proteger a vítima.
Os abusos contra cidadãos ocorridos em repartições públicas devem ser reprimidos e o sistema precisa ser aprimorado para deixá-las apresentar e relatar os fatos, da forma mais livre possível, pois esse é um dos mecanismos para incentivar e encorajar as pessoas lesadas a procurar os caminhos legais para alcançar a devida justiça. Além disso, deve-se garantir a parte acusada apresentar os fatos de sua defesa, sempre preservando a dignidade das partes.