Em uma decisão que reacendeu o debate sobre o alcance e os métodos da Operação Lava Jato, o Supremo Tribunal Federal (STF) anulou processos envolvendo o ex-ministro José Dirceu, apontando a parcialidade do ex-juiz Sérgio Moro como fator central.
No dia 29.10 o ministro relator Gilmar Mendes destacou práticas abusivas utilizadas pela força-tarefa, como conduções coercitivas, interceptações e a divulgação ilegais e seletiva de comunicações sigilosas. Segundo o STF, essas táticas tinham como objetivo pressionar os réus, desconsiderando o direito constitucional ao julgamento imparcial.
As revelações da “Vaza Jato” mostraram uma colaboração entre os procuradores e Moro, que, segundo Mendes, atuaram em “simbiose” para dificultar as defesas de réus como Dirceu e o ex-presidente Lula. Esse alinhamento, em vez de respeitar as instâncias de investigação e julgamento independentes, teria configurado uma estratégia de ação conjunta com motivações políticas.
Um exemplo marcante dessa parcialidade foi o episódio de julho de 2018, quando Moro, em férias e sem jurisdição, ordenou que o alvará de soltura de Lula fosse retardado. Após o fim do processo, Moro aceitou o cargo de Ministro da Justiça no governo de Jair Bolsonaro, maior beneficiado pela exclusão de Lula nas eleições daquele ano.
O ex-juiz e membros da Operação tinham projeto político de ser alternativa aos partidos tradicionais e, para isso, incutiu na sociedade um sentimento de insatisfação com a classe política, associado a um desejo de mudança nas instituições e, paralelamente, tinham a intenção de abandonar seus cargos públicos para se candidatarem a cargos eletivos, impulsionada pela fama conquistada pela prisão e condenação de políticos.
Além das denúncias contra Dirceu, a força-tarefa chegou a envolver parentes dos réus, como sua filha, em acusações que, segundo conversas vazadas, visavam intimidar psicologicamente o ex-ministro. Mendes criticou essas ações, qualificando-as como uma violação de direitos fundamentais. Em um discurso contundente, o ministro enfatizou que o uso de estratégias midiáticas transformou a Lava Jato em um “espetáculo jurídico”, onde se buscava moldar a opinião pública e influenciar a justiça fora dos tribunais.
A decisão de anular os processos não se restringe ao caso de Dirceu, mas sinaliza uma possível extensão aos demais réus atingidos por práticas semelhantes na Lava Jato, no mesmo contexto da força-tarefa, com anulação por quebra do dever de imparcialidade.
A decisão do STF lança luz sobre a crise de legitimidade que paira sobre a operação, apontada como um divisor de águas no combate à corrupção, mas que agora é criticada por seus excessos e pela suposta instrumentalização política. Em tempos de polarização, a decisão do STF reafirma o compromisso do Judiciário em garantir a imparcialidade, valorizando as garantias constitucionais e preservando a integridade do processo penal.