O Brasil vive um momento econômico peculiar. Enquanto alguns indicadores sugerem uma economia em pleno vigor, outros apontam para desafios estruturais urgentes. No lado positivo, o país comemora sucessivos superávits comerciais e aumento das reservas cambiais, um crescimento do PIB de 3,1% em 2023 com perspectiva de ultrapassar os 3% em 2024, inflação controlada e índices de desemprego historicamente baixos, beirando o pleno emprego.
No entanto, o governo federal reconhece a necessidade de avançar em ajustes fiscais para sustentar esse cenário favorável e cumprir as metas do novo arcabouço fiscal. Foi nesse contexto que, em 02.12, o governo federal apresentou Proposta de Emenda à Constituição (PEC) com medidas voltadas à contenção de despesas públicas e à reorganização da gestão orçamentária.
Entre os pontos, destaca-se a limitação dos salários do funcionalismo público ao teto constitucional, atualmente os vencimentos dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF). Apenas verbas indenizatórias legais poderão exceder esse teto. A medida visa combater a prática de complementos remuneratórios — os chamados “penduricalhos” — que permitem que servidores de alto escalão, especialmente no Judiciário e no Legislativo, recebam acima do teto.
Outras mudanças incluem regras mais rígidas para concessão do Benefício de Prestação Continuada (BPC); limitação do acesso ao abono salarial a trabalhadores que ganham até 1,5 salário mínimo; prorrogação da Desvinculação de Receitas da União (DRU) até 2032, que permitirá ao governo utilizar 30% de receitas vinculadas; revogação do parágrafo 11 do artigo 165 da Constituição, com eliminação da obrigação de execução integral de políticas públicas essenciais previstas no orçamento.
A PEC acerta ao abordar problemas históricos na gestão fiscal brasileira, como a contenção de despesas no funcionalismo público, especialmente nos altos escalões.
Além disso, a flexibilização do orçamento via DRU oferece ao governo maior capacidade de gerenciar crises e priorizar investimentos estratégicos, enquanto a limitação do abono salarial e o endurecimento nas regras do BPC visam uma melhor alocação de recursos.
Em termos de credibilidade, propostas de ajuste fiscal sinalizam ao mercado que o governo está comprometido com a disciplina orçamentária, fator essencial para conter a disparada do dólar e preservar o controle inflacionário.
Apesar das boas intenções, a PEC apresenta fragilidades significativas. A maior parte das medidas busca flexibilizar o orçamento, e não necessariamente cortar gastos de forma significativa. Esse enfoque limitado pode ser insuficiente para cumprir as regras fiscais exigidas pelo arcabouço, como o limite de crescimento de 2,5% das despesas públicas.
O quadro econômico brasileiro é complexo, com elementos que inspiram otimismo e outros que demandam ação imediata. A PEC, embora simbólica e necessária, carece de profundidade para enfrentar os desafios fiscais de forma estrutural e permanente.