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Fotos: Marcelo Camargo/Agência Brasil (https://www.fotospublicas.com/acervo/economia/brasilia-(df)-05-02-2025---o-ministro-da-fazenda-fernando-haddad-e-o-presidente-da-camara-dos-deputados-hugo-motta-durante-entrevista-coletiva-na-camara-dos-deputados)

Estado do bem social x Estado mínimo: o velho dilema que divide o país

A crise fiscal voltou ao centro da disputa política em Brasília, reacendendo antigas divergências ideológicas e institucionais sobre o papel do Estado na economia. O debate, que deveria se concentrar em números, sustentabilidade orçamentária e planejamento de longo prazo, transformou-se em um embate político e partidário, em meio a trocas de acusações entre Senado, Câmara e governo federal. O estopim da vez é o projeto que amplia a isenção do Imposto de Renda (IR) para quem ganha até R$ 5 mil — medida de forte apelo popular, mas de alto custo para os cofres públicos.

A polêmica, porém, vai muito além da disputa técnica. Ela expõe o conflito entre dois modelos de Estado: o Estado social e interventor, que busca reduzir desigualdades por meio de políticas públicas, e o Estado mínimo e liberal, que aposta na eficiência do mercado e na redução da máquina pública.

De um lado, o governo Lula tenta equilibrar promessas sociais com responsabilidade fiscal, defendendo que o crescimento depende de inclusão e investimentos públicos. De outro, a oposição acusa o Planalto de sufocar o setor produtivo com impostos e de insistir num intervencionismo que desestimula o investimento privado e freia a economia.

O impasse se repete em outros temas. A Câmara dos Deputados, por exemplo, retirou o aumento da taxação sobre as apostas online — medida que frustraria a expectativa de arrecadar cerca de R$ 17 bilhões. O episódio evidenciou não apenas a dificuldade em aprovar medidas de ajuste fiscal, mas também o enfraquecimento do diálogo entre os Poderes.

Enquanto Lula aposta em sua popularidade estável (48% de aprovação) e no apoio massivo da população à ampliação da isenção do IR (79% segundo pesquisas), o Planalto tenta conter o desgaste político e preservar uma agenda social até 2026. Já a oposição mira no discurso fiscalista: promete cortar gastos, reduzir impostos e privatizar estatais, com o argumento de gerar eficiência e atrair investimentos privados.

O contraste ideológico se reflete também no cenário latino-americano. Na Argentina, Javier Milei conduz um experimento radical de desmonte estatal, cortando subsídios e benefícios sociais. O resultado: queda da inflação, mas alta no desemprego e aumento da pobreza. Na Bolívia, Rodrigo Paz propõe o caminho do meio — um “capitalismo para todos”, com desburocratização e formalização do trabalho, sem abrir mão da redistribuição de renda.

O Brasil, por enquanto, parece dividido entre extremos. De um lado, o impulso por mais gastos sociais e políticas distributivas; de outro, o apelo por cortes e privatizações em nome da eficiência. O país carece de uma via intermediária — de um projeto nacional que una responsabilidade fiscal e sensibilidade social.

No fim, o impasse fiscal traduz o dilema histórico brasileiro entre o Estado protetor e o Estado enxuto, entre o presente social e o futuro econômico. Um embate que, a cada ciclo político, retorna ao centro da arena, sem que o país consiga encontrar o ponto de equilíbrio entre compaixão e racionalidade.

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