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Foto: Lerone Pieters (https://unsplash.com/pt-br/fotografias/horizonte-da-cidade-sob-ceu-nublado-cinzento-durante-o-dia-enFrcIVgMG0)

Replanejar para pertencer: como o Brasil pode redesenhar suas cidades

No dia 07 de maio, o pesquisador Carlos Moreno, criador do conceito da Cidade de 15 Minutos, viveu na pele o drama que afeta milhões de brasileiros todos os dias: congestionamentos intermináveis e deslocamentos exaustivos entre cidades e bairros. Vindo de um evento em Campinas rumo à capital paulista, sua entrevista começou com atraso — consequência direta do tipo de estrutura urbana que ele justamente propõe transformar.

Moreno foi um dos convidados do 1º Encontro das Cidades do Insper, realizado na Vila Olímpia, zona oeste de São Paulo. Em sua fala, defendeu com firmeza a necessidade de romper com o modelo urbano ultrapassado baseado na lógica da Carta de Atenas (1933), que separou rigidamente as funções da cidade — morar, trabalhar, consumir — e criou uma dependência quase total do automóvel. O resultado? Cidades espalhadas, bairros-dormitório, serviços concentrados e ruas constantemente engarrafadas.

“A norma de zoneamento 100% residencial está obsoleta”, afirmou. Para Moreno, essa separação entre onde se vive e onde se trabalha beneficiou o lobby da indústria automobilística e tornou as cidades menos humanas. Ele defende um novo paradigma: espaços urbanos integrados, onde moradia, trabalho, lazer e serviços convivam no mesmo território, acessíveis a pé ou de bicicleta — tudo a no máximo 15 minutos de distância.

A realidade no Brasil ainda é desafiadora: mobilidade precária, falta de serviços nos bairros e uma cultura que ainda enxerga o carro como símbolo de status.

Como resposta às crises climáticas, sociais e econômicas, Moreno propõe um novo conceito: proxiliência — ou seja, usar a proximidade como forma de resiliência. Isso significa descentralizar serviços, redesenhar o espaço urbano e valorizar o comércio local. Em tempos de pandemias, apagões e enchentes, a solução pode estar bem ao lado: no vizinho, na padaria da esquina, no posto de saúde do bairro.

Moreno também chama atenção para outro dilema: como conciliar densidade urbana com preservação histórica? Em São Paulo, há quem tema que a verticalização descaracterize os bairros. Já o setor imobiliário e os governos argumentam que as torres de uso misto são essenciais para tornar a cidade mais compacta. Para o urbanista, o caminho está no equilíbrio. “Esse não é um debate ideológico. A densidade pode ser feita de forma orgânica, com espaços verdes, desde que o projeto vá além da arquitetura e pense a cidade como um todo.”

O Brasil está numa encruzilhada. De um lado, um passado marcado pela segregação e pelo carro como rei. Do outro, o despertar para um futuro mais próximo, verde e humano.

A Cidade de 15 Minutos não é uma utopia importada da Europa. É uma provocação realista — um convite para resgatar o senso de pertencimento. Mais do que infraestrutura, é uma mudança de valores. Precisamos reaprender a viver perto. A confiar no bairro. A caminhar.

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